Homilia Dominical

12º Domingo do Tempo Comum

As tempestades apresentadas no Evangelho são metáforas das muitas situações difíceis pelas quais passamos em nossa vida.
A tempestade acalmada
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Meus Irmãos e Minhas Irmãs,

No final do Evangelho de hoje vem à pergunta que permeia toda a liturgia deste domingo: “Quem é este, a quem até o vento e o mar obedecem?”(Cf. Mc 4, 41). Falando das tempestades, poderíamos dizer, tempestades da fé, estamos ainda em pleno segredo messiânico. Aproximamo-nos, porém, do momento em que esse segredo será parcialmente desvendado, pelo menos para os discípulos, embora sem que o compreendam.

A Jó é feita uma pergunta por Deus: “Quem fechou com comportas o mar?” (Cf. Jó 38, 8). Até Jó se dá conta do estado nebuloso de seu pensar e confessa: “Disseste bem: Quem obscurece assim a providência com discursos tolos? Falei de maravilhas que me superam sem compreendê-las. Fizeste bem, interrogando-me para que respondesse. Meus ouvidos tinham ouvido falar de ti, mas agora meus olhos te viram. Agora posso retirar-me” (Cf. 42,2-6). O livro de Jó não é só, nem principalmente, um livro de lamúrias. É uma profissão de fé no Deus Criador e Mantenedor da criação. Reclamar contra a manutenção de Deus testemunha uma visão muito curta, se Deus fez tantas coisas maravilhosas e insondáveis no universo. A Sagrada Escritura nega-se a dar uma resposta superficial à problemática de Jó, mas lhe dá como pano de fundo o mistério do Deus vivo e verdadeiro.

Ao recordar a Jó a sua ação criadora sobre o mar, Deus apresenta-Se, antes de mais, intocável na sua transcendência e majestade; e mostra, depois, que tem para a criação um plano estável, amadurecido, consolidado, irrevogável. Quem é Jó para pôr em causa os desígnios desse Deus criador que, com a sua Palavra, controlou o mar? Jó é convidado a aceitar que um Deus de quem depende toda a criação, que até submete o mar, que cuida da criação com cuidados de pai, sabe o que está a fazer e tem uma solução para os problemas e dramas do homem. O homem, na sua situação de criatura finita e limitada, é que nem sempre consegue ver e perceber o alcance e o sentido último dos projetos de Deus.

Só Deus tem todas as respostas; ao homem resta reconhecer os seus limites de criatura e entregar-se nas mãos desse Deus onipotente e majestoso, que tem um projeto para o mundo. Ao homem finito e limitado resta confiar em Deus e ver n’Ele a sua esperança e a sua salvação.

Convivemos diariamente com realidades positivas e negativas, com luzes e sombras. Normalmente, as sombras marcam-nos muito e constituem uma fonte de preocupação e de inquietação. O terrorismo e a violência trazem-nos sofrimento e insegurança; as novas doenças, particularmente a COVID-19, geram medo e inquietação; as catástrofes naturais fazem-nos sentir impotentes e indefesos; as injustiças e arbitrariedades provocam revolta e descontentamento; o desmoronamento de velhas estruturas políticas e sociais provocam anarquia e caos; a produção e o comércio de armas de destruição em massa trazem-nos ansiosos e preocupados. Confusos e desorientados, viramo-nos para Deus. Por vezes, criticamos a sua indiferença face aos dramas do mundo; outras vezes, sentimos a tentação de Lhe mostrar, de forma clara e lógica, como é que Ele devia atuar para que o mundo fosse melhor. A leitura do Livro de Jó que hoje nos é proposta convida-nos, antes de mais, a não nos pormos em bicos de pés e a não exigirmos a Deus que atue segundo as nossas lógicas humanas.

Na verdade, o Deus que criou tudo o que existe, que estabeleceu as leis cósmicas, que conhece os segredos de cada uma das suas criaturas, que cuida de cada ser com cuidados de pai, que mil vezes manifestou na história o seu amor e a sua bondade, não pode ignorar os problemas do homem, ou deixar que a humanidade chegue a um beco sem saída. O nosso Deus está presente na história humana e sabe para onde caminhamos. Ele tem um projeto coerente, maduro, estável, irrevogável para o mundo e para os homens. Por vezes, o sentido desse projeto pode escapar-nos; mas Deus sabe para onde caminhamos e conduz-nos, através das armadilhas da história, ao encontro da realização plena, da vida definitiva.

Meus irmãos,

No Evangelho deste domingo (Mc 4,35-41) Jesus dá ordens para que os discípulos tomassem uma barca e atravessassem o lago em direção às terras pagãs de Gérasa. A noite no Evangelho que refletimos tem um significado escatológico, de salvação daqueles que estão nas trevas, na escuridão, no pecado.  A aventura do grupo, em companhia de Jesus, no meio da tempestade, lembra o acontecido na sinagoga de Cafarnaum: um espírito imundo reage à presença de Jesus. Jesus dá-lhe ordens de calar-se e sair do homem. O espírito, agitando-o violentamente, deu um grande grito e saiu. E todos ficaram admirados. E o mesmo ensinamento se repete no Evangelho de hoje.

Os discípulos estavam apavorados com a situação da viagem dentro do Mar: eram muitos os questionamentos e estávamos no início da missão: noite tempestuosa. Quando sentiram que o barco iria afundar apelaram para Jesus, que deu ordens ao vento e ao mar e recompôs a calmaria. Assim nós devemos relembrar da passagem bíblica: “Sem mim nada podeis fazer” (Cf. Jo 15,5). Realmente, sem a presença de Deus em nossas vidas, pela mediação de Jesus Cristo, nada poderemos fazer. Por isso devemos fazer ponte com outra passagem de João 16,33: “Coragem! Eu venci o mundo!”. Que o poder de Jesus estava evidente ninguém mais duvida. O que ocorre, entretanto, é que os discípulos sentiram e deveriam dar testemunho que Jesus dominava os demônios que moravam no fundo do mar e era o Homem que veio para dar a libertação aos cativos, conforme ficou evidenciado quando Jesus libertou um possesso em Gérasa.

Jesus foi o verdadeiro catequista para os apóstolos no Evangelho de hoje: foi corrigindo os erros e as doutrinas que não condiziam com o seu Projeto de Salvação. Por isso Jesus venceu o mundo quando ao morrer na Cruz redentora anunciou uma nova e eterna aliança: a vida eterna. Daí que a mensagem que os apóstolos deveriam pregar era a chegada do Reino de Deus a hebreus e pagãos, um Reino na terra, nessa vida procelosa. Apesar do mal, apesar das borrascas tenebrosas ocasionadas pela presença do mal no mundo, o Reino é possível, porque Jesus está presente. A atenção e a luta serão incessantes, o medo virá. Mas o pensamento de que Jesus “está conosco” no mesmo barco de nossa vida, de nossa caminhada cotidiana, significa a garantia para a nossa vida.

Irmãos e Irmãs,

A tempestade do Mar da Galiléia foi provocada, segundo entendimento dos apóstolos pelos demônios que moravam no fundo do mar. Este episódio toma um sentido de luta de poderes entre os espíritos do mal e Jesus de Nazaré, encarnação do espírito do bem. Esta luta entre o bem e o mal ocupa largo espaço na literatura bíblica. E a ideia de que os espíritos do mal morassem nos abismos do mar aparece clara nalguns salmos que cantam a passagem do Mar Vermelho, sempre vista pelos Israelitas como uma tremenda vitória de Deus para libertar o povo do mal da escravidão.

O livro de Jó foi escrito exatamente para mostrar a existência dos dois princípios, do bem e do mal, e no trecho que lemos hoje, como primeira leitura (Jó 38,1.8-11), encontramos um Deus soberano do Mar, pondo-lhe limites, isto é, mostrando-se senhor e acima dos espíritos do mal, exatamente como Jesus hoje na barca.

O Evangelho de hoje, ainda, nos fala da humanidade de Jesus. Uma humanidade que está tão presente em sua vida na terra, quanto hoje ela manifesta-se no gesto de dar ordens ao mar revolto. O Evangelista quis ressaltar a verdade de seu poder divino a que se sujeitam todas as criaturas, boas e más. Não se travam batalhas para ver quem é mais forte. Simplesmente, Jesus tem poder, dá ordens, é obedecido. Sua natureza humana, que lhe traz cansaço e sono, não se altera com o gesto de sua natureza divina.

Meus irmãos,

O amor de Cristo por nós é tão grande, que de algum modo nós nos identificamos com ele: somos seu corpo. Para Paulo, isso é muito real. Nossa incorporação com Cristo é uma realidade espiritual. Diz respeito à criatura nova que somos no Espírito. Paulo nem quer mais conhecer a Cristo de modo carnal. Isso não quer dizer que Ele não dá importância à história humana de Jesus. Quer dizer sim que esta história humana não é apenas humana, mas divina. É a história de Deus que nos renovou em Cristo.

A segunda leitura – 2Cor 5,14-17, dá conta da preocupação de Deus com a vida e a felicidade dos homens. A vinda de Jesus ao mundo, a sua luta contra o egoísmo e o pecado, o seu amor incondicional, a sua morte na cruz, pretendeu libertar os homens dos velhos esquemas de escravidão e de fechamento que impediam os homens de ter acesso à vida plena e verdadeira. Contemplar o amor de Deus, tornado presença efetiva na vida dos homens em Jesus, assegura-nos que Deus Se preocupa conosco e que está sempre atento à nossa realização e à nossa felicidade. O nosso Deus não é um Deus indiferente, que deixa os homens abandonados à sua sorte; mas é um Deus interveniente, que nos ama e que, a cada instante, está presente ao nosso lado, a indicar-nos os caminhos da vida.

Por isso, se Jesus parece estar dormindo ou recostado no travesseiro estamos muito enganados. Muitos preferem ver o Cristo da Sexta-feira da paixão: Morto e ponto final! Assim ele não incomoda nossas situações de pecado. Mas, o Cristo é a luz que ilumina a nossa vida, que caminha conosco lado a lado, que é nosso porto seguro. O silêncio de Deus é uma das grandes qualidades que distingue Deus dos homens. No silêncio da história caminha a voz que deve guiar nossas vidas. Assim, nas aflições da vida, procurando segurança em Deus, encontramos Jesus diante de nós, poderoso, sim, mas isso, em última instância, por meio da Cruz, por meio de sua doação de amor. Aí, ele revela o poder maior de Deus em sua pessoa. Reconhecendo isso, teremos confiança para enfrentar as tempestades de nossa história.

A preocupação de Deus com a vida e a felicidade dos homens. A vinda de Jesus ao mundo, a sua luta contra o egoísmo e o pecado, o seu amor incondicional, a sua morte na Cruz, pretendeu libertar os homens dos velhos esquemas de escravidão e de fechamento que impediam os homens de ter acesso à vida plena e verdadeira. Contemplar o amor de Deus, tornado presença efetiva na vida dos homens em Jesus, assegura-nos que Deus Se preocupa conosco e que está sempre atento à nossa realização e à nossa felicidade. O nosso Deus não é um Deus indiferente, que deixa os homens abandonados à sua sorte; mas é um Deus interveniente, que nos ama e que, a cada instante, está presente ao nosso lado, a indicar-nos os caminhos da vida.

O objetivo de Deus é fazer aparecer o Homem Novo e a Nova Humanidade. Aos homens, é pedido que aceitem a proposta de Deus, que aceitem renunciar à vida velha do egoísmo e da escravidão e que aceitem nascer, livres e transformados, para o amor que nos torna livres. São Paulo, depois de ter encontrado Jesus, de ter aderido à sua proposta e de ter feito a experiência da liberdade e da vida nova, tornou-se testemunha, diante dos homens, do projeto salvador e libertador de Deus para os homens. Cada homem e cada mulher que se encontra com Jesus e que faz a mesma experiência de Paulo, tem de tornar-se arauto das propostas de Deus e de anunciar aos seus irmãos, com gestos concretos, essa oferta de vida nova e verdadeira que Deus nos faz.

Caros irmãos,

A Tempestade é acalmada por Jesus! A imagem do barco dos discípulos em meio à tempestade, na travessia para a outra margem do lago, oferece-nos uma descrição das primeiras comunidades em sua caminhada em busca da vida nova oferecida por Jesus. Esse texto nos convida a tomar consciência de que a comunidade nascida de Jesus é comunidade missionária, que enfrenta os perigos para ir ao encontro das pessoas. Urge reconhecer que ser discípulo de Jesus supõe deixar as instalações cômodas e tranquilas dos espaços seguros e protegidos, defendidos dos perigos do mundo e alheios aos grandes problemas que afligem a humanidade, sobretudo os pobres, os migrantes e os marginalizados. No entanto, o Evangelho deste domingo nos garante que Jesus não abandona o barco de seus discípulos. Ele está sempre lá, embarcando com eles na mesma aventura, dando-lhes segurança e paz. Nos momentos de crise, desânimo e medo, os discípulos têm de ser capazes de descobrir sua presença silenciosa, mas sempre amorosa, que não os deixa sós.

As tempestades apresentadas na primeira leitura e no Evangelho são metáforas das muitas situações difíceis pelas quais passamos em nossa vida. Estamos no barco, as tempestades estão furiosas ao nosso redor, e, como os discípulos, podemos acreditar que Jesus não se importa ou está dormindo. Esperamos estar tão familiarizados com Jesus quanto seus discípulos. Se sentirmos que Jesus está dormindo, estaremos à vontade para acordá-lo e apresentar-lhe nossas necessidades? Jesus não repreende seus discípulos por acordá-lo. Em vez disso, repreende-os por falta de fé, por falta de perspectiva. Quando levamos nossas preocupações a Deus em oração, talvez comecemos a aprender a ver as coisas em sua perspectiva.

Muitas vezes, ao longo do nosso caminho de discipulado, podemos nos sentir sozinhos e confrontados com a oposição e a incompreensão do mundo, como os discípulos no barco com Jesus. Experimentar a impotência e a fragilidade diante de grandes adversidades pode nos angustiar e nos fazer ter o sentimento de que Jesus nos abandonou. O Evangelho desta liturgia nos assegura que Jesus nunca fica de fora do barco dos discípulos. Ele está sempre embarcando conosco nas aventuras da missão, para nos dar segurança e paz. Nos momentos de crise, de desânimo e medo, somos desafiados a descobrir como ele está presente em nossa vida e como cuida de nós.

Tenhamos presente e fiquemos atentos de que a missão dos que se dedicam ao serviço do Reino de Deus não é fácil. A vida de discípulos não raro comporta momentos de solidão, oposições, incompreensões do mundo. Seguir Jesus não livra o discípulo do confronto com suas fragilidades e impotências diante de determinadas circunstâncias. Muitas vezes, nossa fé não é suficiente e precisamos ouvir a pergunta de Jesus – “Ainda não tendes fé?” –, porque não conseguimos identificar sua presença amorosa em meio às tempestades da existência. Ele não faz intervenções mágicas em nossa vida, mas está em comunhão conosco sempre, em qualquer lugar e situação.

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