Iniciamos as reflexões deste ano de 2002, em sintonia com o apelo de João Paulo II para a celebração do Dia Mundial da Paz. A mensagem do papa está significativamente resumida por uma expressão solene que pode e deve transformar-se num sério compromisso para todos. “Não há paz sem justiça, não há justiça sem perdão”.
Esta mensagem dispensa qualquer comentário. De nossa parte, trata-se de acolhê-la como um grande desafio que possa realmente questionar e iluminar a caminhada do nosso dia-a-dia.
Com efeito, a Sagrada Escritura, que forma o pano de fundo da mensagem papal, não fornece critérios de interpretação só para compreender a história de Israel ou da Igreja primitiva, mas oferece os mesmos critérios para compreendermos os acontecimentos atuais. Grandes mudanças sem precedentes na história da humanidade, a queda de muitas ideologias, a derrubada de muitas barreiras e outras situações inéditas estão diante dos olhos de todos, e todas elas constituem a causa principal do clima de instabilidade e de insegurança dos tempos atuais.
É interessante, portanto, prestar atenção às palavras do profeta Isaías: “Obra da justiça será a paz, e o efeito da justiça será a tranqüilidade e a segurança para sempre. O meu povo habitará em moradas de paz, em mansões seguras, em lugares tranqüilos” (Is 32,17-18). À primeira vista, esta afirmação, se aplicada literalmente aos dias de hoje, poderia parecer uma cruel ironia. No entanto, trata-se de uma realidade muito séria, mesmo se esta mensagem foi proclamada no oitavo século antes da nossa era. É verdade que uma época de justiça, de tranqüilidade e de paz parece estar muito longe ainda.
De fato, o mundo em que vivemos continua mergulhado em profundas dilacerações e sob a contínua ameaça de eventos sombrios. Mas, exatamente por isso, as palavras proféticas incentivam e fundamentam a busca do caminho certo, para que a humanidade consiga construir relações humanas, de justiça, de harmonia e de paz.
Naturalmente, o sentido da paz não é aquele que indica somente uma ausência de conflitos, mas é aquele que indica a plenitude da vida humana em todos os sentidos! É necessário lembrar, porém, que a vida como um todo é um dom, e como tal não pode absolutamente ser possuído nem acumulado!
A plenitude da vida, indicada pela afirmação profética com o termo “shalom/paz”, é uma realidade que só pode ser partilhada e doada. Qualquer pessoa que pára para pensar um instante, se dá conta de que a vida vale realmente a pena ser vivida integralmente, só se ela for doada. É nesse sentido que irrompe no nosso horizonte a instrução de Jesus a seus discípulos: “Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça...” (Mt 6,33).
Para alcançar a plenitude da vida, é preciso enfrentar o caminho da busca do Reino de Deus e este caminho é o caminho da gratuidade e do perdão. A partir dessas simples referências ao profeta Isaías e ao Mestre de Nazaré, é possível constatar que existem critérios que permitem encontrar um sentido profundo da vida humana. Mesmo mergulhando em toda e qualquer turbulência da história, o critério da busca da justiça e da paz, da gratuidade e do perdão permite a todo ser humano, seja ele quem for, carregar o próprio fardo de fragilidades e de responsabilidades e seguir em frente. Sem perdão, o ser humano não poderia mais viver. Sem perdão a própria história pára! É verdade que muitas vezes, trata-se de carregar um fardo pesado, mas é verdade também que a justiça que suscita a paz, percorrendo o caminho da gratuidade e do perdão, leva de fato o ser humano à plenitude da vida. Trata-se de uma visão ideal e ingênua da realidade atual? Justiça e gratuidade, paz e perdão, são única e exclusivamente um sonho?
Autor: Sergio Bradanini
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