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O valor dos bens terrenos
Por: DOM EURICO DOS SANTOS VELOSO
ARCEBISPO EMÉRITO DE JUIZ DE FORA, MG.
 
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Thomas Merton, na introdução de um pequeno livro, onde transcreve várias sentenças dos “Padres do Deserto”, escreveu: “ A sociedade  com que sonhavam era aquela em que todos os homens fossem verdadeiramente iguais, onde a única autoridade abaixo de Deus era a carismática autoridade da sabedoria, experiência e amor.”
 
Quem eram esses “Padres do Deserto? Quando, no século IV, ruía o Império Romano e a sociedade pagã, limitava o seu horizonte apenas na prospecção da vida terrena , esses homens a encararam como um desastre e, no deserto, buscavam a sabedoria. O próprio fato do imperador ter-se tornado cristão e de que a águia romana estava sendo substituída pela cruz reforçava sua decisão. Tinham dúvida na construção de uma  sociedade cristã pela incompatibilidade da política e do cristianismo.Sua visão era mística e nesse espírito vislumbravam a salvação.Para eles a única sociedade era espiritual e extra mundana, o Corpo Místico de Cristo, fala-nos o mesmo autor  citado.

Santo Agostinho não se distanciava desse pensamento, quando escreveu “De civitate Dei”, distinguindo as duas cidade, a de Deus e a dos homens, ainda que séculos mais tarde, um escritor francês, trouxesse a mesma idéia numa visão mais terra-a terra, ,quando escreveu “Lês parfums de Rome” e “Lês odeurs de Paris”.

Eles não se distanciavam de uma realidade temporal, mas ultrapassando o tempo, insistiam numa dimensão que não se limitava a essa visão do que passa, da efemeridade das grandezas terrena. Insistiam nos valores do espírito que se realizará plenamente na Parusia, quando pela ação do Espírito Santo, agindo em nós, agindo em toda a Igreja, tivermos realizado em nossas pessoas e no mundo, a morte do homem velho e ressuscitarmos no homem espiritual, formado à imagem de Cristo.

Nesse momento veremos realizadas, em sua plenitude, as bem-aventuranças, o Reino dos Pobres e rejeitados, então transfigurados e gloriosos.

Na historia do Povo de Deus, há momentos propícios de graça e de misericórdia que fazem-nos isto ver antecipado ou que nos lembra a necessidade de com isso conformar nossas vidas se quisermos viver na sabedoria.

Nos dias de hoje, quando a população mundial já ultrapassa 6  bilhões de pessoas, quando as comunicações  na imagem e no som são praticamente instantâneas, assistimos e sofremos os impactos das tragédias e cataclismos, a fugacidade da glória e do poderio terreno. E tudo passa na mesma rapidez das imagens logo esquecidas na sua sucessão em novelas e propagandas que exaltam os pecados, antes de incentivar a educação e a formação social. Riquezas desaparecem e vida preciosas são abatidas. No dia seguinte nada mais resta, nem comentários.

Por outro lado, sempre há exemplos de vida. Vidas diferentes da que levamos, que, aos nossos olhos são até um escândalo ou loucura, como fala o Apóstolo. Pedimos um sinal e a cruz nos parece, como pareceu para os judeus, um escândalo, e uma loucura para os gregos.

Francisco de Assis, Tereza de Calcutá superaram e civilização do homem adâmico e procuraram viver as bem-aventuranças. Nada tinham e eram ricos, porque tudo possuíam. Consideravam as riquezas e a glória deste mundo como esterco diante da sabedoria da excelência do conhecimento de Cristo e do seu amor que abraça de uma extremidade a outra da terra (Fil. 3, 7-12). Viviam a sabedoria do Reino, onde tudo sublimavam, inclusive os bens da terra, no amor.

Já no Antigo Testamento a sabedoria do Povo de Deus refletia sobre a vaidade e estupidez de quem põe sua esperança nas riquezas. As fortunas amealhadas com dor e sacrifício passam a outros que não trabalharam, quando não dissolvidas e dispersas nas querelas sem fim.

O Divino Mestre nos ensinou, na simplicidade do texto evangélico, que só na humildade consegue-se entender, para “buscar o Reino de Deus e a sua Justiça que todo o resto nos será dado por acréscimo”

Na preparação deste Reino, procuremos dar o real valor às coisas. Que elas não nos dominem para que saibamos usá-las com a sabedoria. Não precisamos fugir fisicamente do mundo, como os “Padres do Deserto” Vivamos, pela graça, na gloriosa liberdade dos filhos de Deus e teremos o descanso e repouso para nossas almas.



 
 
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