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A Transfiguração
Por: DOM EURICO DOS SANTOS VELOSO
ARCEBISPO EMÉRITO DE JUIZ DE FORA, MG.
 
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Deus nos deu inteligência e perspicácia, mas nós, apegados à vidinha do dia-a-dia, não conseguimos enxergar além do nosso nariz. O homem consegue ir à lua e não vê o que é mais profundo, que está bem ao seu alcance e que é verdadeiro e eterno, que não o faz arriscar a vida, mas renová-la. E não é porque não temos capacidade. Um pouco é desinteresse, pois ficamos preocupados com o que é palpável, vantajoso; o que é mais cômodo, aquilo que não exige que abramos o coração, deixando a amor, a fé, a confiança entrar.

Os apóstolos conviveram com Jesus, ouviram a sua mensagem, assistiram a seus milagres, acompanharam-no cotidianamente, mas ainda não tinham compreendido a verdadeira dimensão da sua missão messiânica.

Querendo forçar o raciocínio deles, disse-lhes que, como os fariseus não O escutavam, eles também, os apóstolos, se quisessem, poderiam seguir outro mestre. E São Pedro responde: “A quem iremos, Senhor? Só tu tens palavras de vida eterna.”

Em outra ocasião, Ele pergunta a seus discípulos: “Quem vocês acham que eu sou?” E o mesmo São Pedro responde: “Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo.”

Muito bom. Estavam reagindo. Mas, quando Ele disse que devia ir a Jerusalém para se submeter a sua Paixão, os apóstolos se revoltaram. Não concordaram, não compreenderam.

A Transfiguração de Cristo tem por finalidade justificar a fé dos apóstolos em vista da Paixão: a subida à montanha, onde Ele se transfigurou, prepara a subida ao Calvário. “Cristo, cabeça da Igreja, manifesta o que o seu corpo contém e irradia nos sacramentos: a esperança da Glória”, nas palavras de São Paulo aos colossenses.

A presença de Moisés e Elias documenta o que a Lei e os Profetas já diziam, no Antigo Testamento sobre o Redentor. Ainda assim, São Pedro queria construir uma tenda para eles, sem ter a compreensão total do que estava presenciando.

Uma nuvem cobre os apóstolos, fazendo-os enxergar melhor, sob a ação do Espírito Santo. E uma voz ressoa para eles: “Este é o meu Filho muito amado. Escutem-no.”

Como no Batismo de Cristo, a Santíssima Trindade se manifestou. Foi então que os apóstolos compreenderam e acreditaram. Eles tiveram, por um momento, um vislumbre do Céu.

Somos todos nós lerdos no pensar e no agir. É preciso que se coloquem as verdades no nosso nariz para que possamos pensar em compreender. Somos como os apóstolos. Somos ainda piores, porque eles eram homens rudes, sem muita instrução. E nós, mesmo quando estudamos acerca da vida e do mundo, mesmo quando somos muito “instruídos”, ainda necessitamos que o Senhor se transfigure ante nós, para crermos na sua missão salvífica.

Nesses dias estou peregrinando na cidade eterna de Roma, visitando os túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo e fazendo a experiência quaresmal de peregrinação e de penitência. Faço esta peregrinação em agradecimento a Deus pela graça de ter servido com destemor e dedicação exclusiva às Igrejas de Luz e de Juiz de Fora. Aqui rezo por você que me acompanha semanalmente na partilha destes modestos textos. O que me anima ainda a escrever é partilhar a existência vivida na busca do Transfigurado. O testemunho dos evangelistas sobre a transfiguração de Cristo (e os sinóticos documentam os fatos) deve levar-nos a, não só crer, mas agir, como conseqüência desta crença, amando-nos uns aos outros, perdoando os tropeços de cada um, ajudando-nos mutuamente a se levantar, combatendo a ganância, a violência, o egoísmo, para que consigamos construir um mundo novo, transfigurado, cheio de luz, paz, igualdade, justiça, amor. Sem dúvida este será um vislumbre do Céu.



 
 
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