Tempo de Esperança |
Por: DOM EURICO DOS SANTOS VELOSO
ARCEBISPO EMÉRITO DE JUIZ DE FORA, MG. |
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Tempo do Natal, tempo de esperança. À celebração da data magna da cristandade sucedem-se outras celebrações marcantes e oportunas para nossa reflexão. Este momento do calendário litúrgico nos apresenta, em poucos dias, o plano de salvação de Deus para conosco, Sua revelação, o mistério da encarnação, a manifestação divina entre os homens e o exemplo daqueles que nos precederam na fé, fortalecendo-nos a esperança em Cristo.
Quando se vislumbra um novo ano, essas esperanças são renovadas. Dias melhores, saúde, paz, prosperidade, realizações dos sonhos são os augúrios mais comuns nas visitas, nos cartões nas diversas formas de expressar o bem-estar daqueles que nos são caros. Todavia, observa-se que, talvez pela deturpação do real sentido do Natal, falta um sentido cristão em todos esses votos, que devem ser fundamentados no recolhimento, na humildade e na santidade do presépio de Belém.
Quando a Igreja determinou a celebração do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo na comemoração do solstício de inverno, no hemisfério norte, esclarecia aos pagãos quem era o verdadeiro sol que veio iluminar as nações, aquecer os corações enrijecidos e guiá-los, sob o signo da cruz, à plenitude da vida. Era o apontar do porvir na fé.
Ainda hoje, a celebração da Natividade nos aponta o caminho a seguir nos dias que se sucederão a partir do início de um novo ano, conforme o calendário gregoriano. É como que um novo tempo onde se deve trabalhar pela implantação do reinado de Cristo na terra. Para melhor assimilação dessa proposta, ainda, a Igreja celebra por estes dias o proto-mártir, aquele que primeiro se entregou ao Evangelho até à morte, Santo Estevão, sinal de dedicação ao ministério que lhes foi confiado. Depois a festa do discípulo amado, São João Evangelista, protótipo de devotado amigo de Jesus. A comemoração dos Santos Inocentes é-nos um paradigma inconteste de tudo suportar para “testemunhar com a nossa vida o que os nossos lábios professam”, conforme rezamos no Ofício das Horas.
Outras comemorações também nos preparam para que, com o espírito alimentado na doutrina e na fé, possamos iniciar o novo ano com disposição para a construção de um mundo mais fraterno, cristão. Com a solenidade da Sagrada Família, buscamos inspiração na casinha de Nazaré, onde numa contemplação constante vivem José e Maria, sem se descuidar de suas obrigações. Eles nos mostram a possibilidade de, na vivência com os entes queridos, no trabalho, no lazer, poder ir se oferecendo continuamente ao Pai, na certeza de estar fazendo a Sua vontade.
Depois vem a grande solenidade da Santa Mãe de Deus. Sob a proteção de Maria Santíssima, iniciamos um novo ano. É ela, em nosso tempo, a prefiguração da estrela que guiou os Magos até Belém, indicando-nos Jesus. Quando surge nos contextos histórico e litúrgico a figura de Maria, é como o raiar de uma luz intensa que tanto clareia, quanto aquece, ilumina, envolve todo o orbe cristão sob seu cerúleo manto. É a estrela que nos guiará, com certeza, pelos dias que se sucederão ao longo do novo ano, numa caminhada alegre, buscando fazer em tudo e sempre a vontade do Pai, assim como Ela o fez.
É, ainda, a comemoração do Dia Internacional da Paz. Na oitava do Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo celebra-se aquele sentimento puro de tranqüilidade, de confiança, de inspiração em Deus: a paz. “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vo-la dou como o mundo dá. Não se perturbe nem se intimide vosso coração” (Jo 14,27). E essas palavras do Divino Redentor, ao final de sua passagem por este mundo, devem ser mais observadas nesta época em que se compreende a paz de muitas maneiras, mas poucas, ou nenhuma, da forma como Ele quer que a vivamos, na inspiração do Espírito Santo. É a certeza do amor de Deus e a vida em conformidade com a Sua vontade.
O místico São Gabriel de Santa Maria Madalena afirma que a paz de Jesus se baseia nas boas relações com Deus, na observância de sua palavra, na comunhão íntima com ele. “É a paz de quem se deixa guiar pelo Espírito Santo e age segundo sua luz. Paz que nesta vida não dispensa o sofrimento, mas infunde coragem para enfrentar sem medo até a luta, quando necessária, para conservar a fé em Deus. Paz que será absoluta, sem sombra de perturbação, na Jerusalém celeste onde Cristo, ‘o Cordeiro’, será a ‘lâmpada’ que iluminará (Ap 21,23) e a felicidade que alegrará para sempre os eleitos” (in “Intimidade Divina”, 132).
Em sua mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2009, o Santo Padre Bento XVI alerta para os problemas no mundo, principalmente a pobreza. “Combater a pobreza, construir a paz” é o tema de sua mensagem, cujo corolário é o convite à partilha em todos os sentidos, como cristãos, em favor dos pobres, “nos quais vê Cristo, sentindo ressoar constantemente em seu coração o mandato do Príncipe da paz aos Apóstolos: ‘Vos date illis manducare’ – ‘Dai-lhes vós mesmos de comer’ (Lc 9, 13)”.
É a voz de Pedro que nos exorta à caridade fraterna, nos “impulsos de solidariedade criativa, tendentes não só a partilhar o supérfluo, mas sobretudo a alterar ‘os estilos de vida, os modelos de produção e de consumo, as estruturas consolidadas de poder que hoje regem as sociedades’ (João Paulo II in “Centesimus annus”)”. É o Papa quem nos acena, indicando-nos o caminho que nos conduzirá à verdadeira Paz, na vivência do amor, na unidade da Santa Igreja, na graça do Espírito Santo.
Esta é, pois, a paz que desejamos a todos os nossos caros padres, religiosos e fiéis católicos de nossa querida Arquidiocese de Juiz de Fora. Que, em 2009, reencontrem-se em sua família, em sua comunidade, a partir de onde sairão a exalar a vivência dessa paz, que é a experiência da vivência em Cristo Senhor, na esperança da vida eterna.
Feliz Ano Novo!
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