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Vivei sempre alegres
Por: DOM EURICO DOS SANTOS VELOSO
ARCEBISPO EMÉRITO DE JUIZ DE FORA, MG.
 
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Na liturgia deste domingo, em que celebramos o 3º Domingo do Advento, a Epístola de São Paulo começa convidando-nos à satisfação plena: “Vivei sempre alegres” (1Tes 5,16). Essa alegria que o Apóstolo nos propõe é aquela que vem de Cristo, por sermos cristãos, por termos assegurada a nossa salvação, pelos méritos da Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus.

Na perspectiva da eternidade, a alegria deve se espelhar, ou ser um antegozo, do que viveremos na plenitude do céu. Portanto, a alegria é um dos novíssimos a que tendem o homem. Se imprimirmos esse sentido místico a um sentimento que tanto nos satisfaz, a ação de graças e o louvor também hão de fazer parte dessa união com Deus: “orai sem cessar, dai graças em todas as circunstâncias, pois esta é a vontade de Deus”, continua São Paulo.

A propósito das comemorações do Ano Paulino, quando estudos mais profundos sobre a vida e a obra do grande Apóstolo têm sido empreendidas, por especial recomendação do Santo Padre Bento XVI, observe-se que a alegria é uma característica em suas cartas. Não aquela manifestação leviana que o mundo facilmente nos propõe, mas o sentimento que nos brota das convicções cristãs e dos anelos de viver na plenitude da graça do Espírito, em comunhão com Cristo, na fraternidade que deve ser ardente entre todos nós que vivemos unidos em seu Corpo Místico. Não só nesse momento em que o Apóstolo se dirige à comunidade de Tessalônica, mas também em outras missivas, ele nos recomenda: “Alegrai-vos sempre no Senhor; repito: alegrai-vos” (Fil 4,4); ou ainda, “quem se gloria, glorie-se no Senhor” (1Cor 1,31), numa alusão ao profeta Jeremias.

A alegria é fruto da esperança. A alegria que todo cristão deve trazer consigo, inata pela graça do Batismo, deve ser movida pela esperança da vinda do Senhor Jesus, na expectativa da parusia. É o mesmo sentimento que experimentou o povo hebreu, preparado pelos profetas para a chegada do Messias. No ano litúrgico estamos vivendo esse momento na história da redenção da humanidade; em nossa vida devemos viver da mesma forma, endireitando nosso caminho, como São João nos conclamava no último domingo, para o retorno glorioso daquele que é o único e verdadeiro remédio e salvação.

No cristão não pode existir perturbação, desolação, tristeza. O cristão deve expressar sempre, em seu semblante, nas suas conduta, na sua vida em família e na comunidade a tranqüilidade, as mais puras aspirações fraternas, a alegria, enfim. É o gáudio com que o arcanjo Gabriel anunciou a Maria a encarnação “Ave, cheia de graça”; o mesmo com que os anjos anunciaram o nascimento do Cristo em Belém: “Eis que vos anuncio uma boa-nova, que será de grande alegria para todo o povo” (Lc 2,10). É também a mesma alegria com que Maria O viu crescer “em estatura, em sabedoria e graça, diante de Deus e dos homens”, guardando tudo em seu coração (Lc 2, 51-52).

Há de ser um espelho para nós, ainda, a alegria dos primeiros cristãos, que se entregavam ao martírio por amor a Cristo e à sua Igreja, e tantos outros que palmilharam por essa mesma senda de santidade. Quantos, ainda hoje, em meio às tribulações da vida não se permitem transparecê-las, e se mostram sempre unidos com Cristo, pela sua graça, suportando as agruras com paciência e confiança, oferecendo-as a Deus. Lembra-nos o Santo Padre em sua última encíclica “Spe Salvi” que “sofrer com o outro, pelos outros; sofrer por amor da verdade e da justiça; sofrer por causa do amor e para se tornar uma pessoa que ama verdadeiramente: estes são elementos fundamentais de humanidade” (II,39). E paternalmente expõe-nos o compadecimento divino, pelo que devemos nos alegrar, pela sua misericórdia. Logo, constantemente felizes.

Comenta Francisco Fernández Carvajal que o cristão deve ser um homem essencialmente alegre em Cristo, levando essa alegria dentro de si, por encontrar Deus em seu íntimo pela graça. “A alegria do cristão é profunda e capaz de subsistir no meio das dificuldades. É compatível com a dor, com a doença, com o fracasso. ‘Eu vos darei uma alegria que ninguém vos poderá tirar’” (in “Falar com Deus”).

Nessa alegria, portanto, da confiante esperança em Cristo, preparemo-nos bem para a celebração de seu Natal. Na freqüência aos Santos Sacramentos, na meditação da Palavra e na atenta escuta ao Magistério da Igreja, a exemplo da Virgem Santíssima, em constante união e entrega à vontade de Deus, no silêncio do coração e alertas às necessidades do mundo moderno, para que se endireite os seus caminhos, viveremos alegres na expectativa do retorno glorioso de Jesus, nos séculos futuros.



 
 
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