Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua Justiça. |
Por: DOM EURICO DOS SANTOS VELOSO
ARCEBISPO EMÉRITO DE JUIZ DE FORA, MG. |
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Quando a gente põe um pouco mais
de atenção no noticiário dos jornais, das
emissoras de rádio e televisão, o desânimo,
quando não o medo, nos domina.
Não é fácil viver num mundo assim.
Cataclismas metereológicos e catástrofes sociais,
atentados à propriedade e à vida atingindo inocentes.
Há, nas guerras, princípios que são mais
ou menos seguidos, hoje menos seguidos, como o respeito aos
alvos civis e o tratamento humanitário aos prisioneiros,
mas, na guerrilha urbana ou rural nem isso há, senão
a destruição de toda a ordem.
Aparecem, então, e proliferam os cientistas sociais de
todas as emissoras, de todas as escolas e os políticos
oportunistas, inclusive aqueles que oferecem ajuda ostensivamente,
mas são incapazes de se reunirem, como líderes
responsáveis, e traçarem uma estratégia
objetivando o bem comum.
A situação não é única na
história da humanidade e de cada povo. Sempre ocorreu,
quando cansados de um modelo de civilização ou
de uma ordem social que se tornaram ou se tornam incapazes de
solucionar os anseios humanos, pessoais e coletivos, o grupo
corre atrás do novo ou fabrica para si “mestres
à feição dos seus desejos”, como
expôs São Paulo ao seu discípulo e “filho
muito amado”, Timóteo.
Agostinho, Ambrósio, Jerônimo que assistiram a
derrocada do Império, com os “Bárbaros”
batendo às portas de Roma, tiveram a coragem profética
de denunciar as causas, enquanto implantavam na Cruz de Cristo
os fundamentos de uma nova era que Bento e seus filhos levaram
adiante na evangelização da Europa medieval.
No século XVI, quando se rompeu a unidade da fé
no Ocidente Europeu, implantando-se os fundamentos do individualismo,
muito mais que na cultura, onde tem seus méritos, mas
também na fé, o Concílio Tridentino, talvez
com um pouco de excesso no regulamento comunitário, firmou
os princípios doutrinários decorrentes do Evangelho.
Dada a evolução técnica e cultural, o crescimento
vertiginoso da população que em pouco mais de
cinco décadas triplicou, os movimentos migratórios,
a concentração da renda em parcela mínima
da sociedade que se espraia na miséria, a crise que subjaz
em todos os acontecimentos de hoje é muito mais grave.
As sugestões violentas, como a pena de morte e a eliminação
da vida pelos abortos, a força das armas e do poderio
militar têm demonstrado sua ineficiência. Recebem
até, pelo contrário, a contradita com agressão
mais violenta.
Há também, as paliativas, como o empenho na educação
e maior atenção do Poder pelos mais pobres e necessitados
que, infelizmente, soam mais como politiqueiras, pois já
há muito deveriam ter sido implantadas.
Em obediência ao preceito paulino ao mesmo Timóteo
no texto citado –de pregar a palavra “opportune
et inopportune” temos de inocular a fé na cultura
que vivemos.
Esta é a missão do cristão, que pelo batismo
é apóstolo, é enviado.
Nada há que possa orientar uma nova civilização
que está a nascer dos escombros de um individualismo
que atingiu as raias do ateismo e, conseqüente, da negação
da própria dignidade do homem senão o Evangelho.
O jurista Fábio Comparato, em seu livro sobre a Ética,
diz que encontramo-nos numa encruzilhada nos albores deste século
XXI. O individualismo que nasceu no meio escolástico
medieval e foi levado à pratica com a Reforma e movimentos
posteriores representa uma evolução. O homem tornou-se
o centro do Universo e, com o dom da sua liberdade, cabe-lhe
ordenar o destino do mundo ou segundo a ordem divina ou levando-o
a “cidade dos homens”, oposta à “cidade
de Deus”, parafraseando Agostinho. Está, pois,
em nossas mãos.
Abrindo o Evangelho temos a aula inaugural de Cristo no Sermão
da Montanha. Ali está realmente o que pode nos ajudar
a sair do marasmo dos dias atuais e fincar os alicerces de uma
nova era: a abertura de nosso coração à
simplicidade da vida, à pureza, ao ósculo da paz.
Será uma traição ao Evangelho se deixarmos
passar esta oportunidade rara na história, de poder marcá-la
com o sinal redentor de Cristo para as gerações
futuras, gozando desde agora as riquezas evangélicas.
“Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça
e tudo o mais vos será acrescentado”.
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