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A Igreja e o Reino
Por: Pe. Elílio de Faria Matos Júnior
Vigário Paroquial da Paróquia Bom Pastor
Juiz de Fora, MG
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A Igreja, tenho dito isto repetidamente, não é um mero acessório no Plano de Deus. Ela integra o mistério da salvação. O Reino de Deus, que almejamos e que é dom de Deus para nós, não está, de modo algum, desvinculado da Igreja.

Embora a Igreja, em seu estado de peregrina neste mundo, não realize plenamente o Reino, embora o Reino não esteja contido dentro das fronteiras visíveis da Igreja, embora o Reino transcenda a Igreja considerada em seu aspecto social e visível, ele, o Reino, já se encontra em germe nela e não pode ser concebido sem uma relação estreitíssima com ela.

Desse modo, a Igreja não é apenas um sinal, entre outros, do Reino. Ela não é apenas “chamada” a ser “o melhor sinal”, como já ouvi alguém dizer por aí. Tal afirmação peca contra o legítimo conceito católico de Igreja. Ela, na verdade, é já o Reino em germe (cf. Lumem Gentium, 3), é o sinal visível e indefectível do Reino, é o sacramento universal da salvação.

Foi uma concepção equivocada, que vigorou em certas linhas de pensamento teológico, que, querendo combater o que chamavam de “eclesiocentrismo”, desvinculou o Reino e a Igreja, em favor de uma tal teologia “reinocêntrica”. O Reino passou a ser considerado de tal forma que a sua relação com a Igreja foi empalidecida ou mesmo negada. E o próprio conceito de Reino sofreu violência ao ser tomado prevalentemente em sentido mundano, como se outra coisa não fosse senão a realização da justiça e da paz social. A Igreja, nesse sentido, seria apenas um sinal do Reino entre outros, já que qualquer entidade governamental, associação ou ONG pode trabalhar em favor da justiça e da paz social. Não que a justiça social e a paz entre os homens sejam indiferentes ao Reino. Mas o Reino é muito mais. É a participação na vida divina.

Segundo a posição “reinocêntrica”, o Reino poderia chegar sem relação com a Igreja. Segundo as posições mais extremadas dessa concepção, a Igreja seria uma espécie de acessório descartável, que, muitas vezes, teria mesmo prejudicado a implantação do Reino. Tal concepção desconhece a natureza da Nova Aliança, que é sacramental no sentido forte da palavra: Deus quer valer-se de realidades sensíveis livremente escolhidas por ele, como a humanidade do Verbo, a Igreja visível, os sete sacramentos, para levar a efeito a obra salvífica. Desconhece o “mistério da Igreja”, do qual tanto fala o Vaticano II. Desconhece que a Igreja foi feita indefectível por graça de Deus, embora encerre no seu seio frágeis pecadores.

A indefectibilidade da Igreja, com a qual Cristo quis ornar sua Esposa, é a garantia de que, apesar de todas as fraquezas humanas que nela atuam, ela não pode falhar substancialmente em sua missão, e não pode ser reduzida simplesmente a um sinal entre outros do Reino. Ela é “o” sinal. Por disposição divina, o único Mediador entre Deus e os homens quer fazer-se presente entre nós mediante seu Corpo, que é a Igreja. Assim, a Igreja católica é a única via ordinária que nos conduz a Cristo, uma vez que Cristo a quis como instrumento e sacramento da salvação; somente nela estão presentes todos os elementos salvíficos queridos por Cristo, embora fora de sua demarcação visível se encontrem elementos de santificação e verdade. São palavras do Concílio Vaticano II: “Só pela Igreja católica de Cristo, que é o meio geral de salvação, pode ser atingida toda a plenitude dos meios salutares” (Unitatis Redintegratio, 3). Essa Igreja é a bandeira erguida entre as nações, de tal modo que o Reino de Deus, inaugurado por Jesus, nela atua eficazmente sem possibilidade de perda.

A declaração Dominus Iesus, publicada em 2000 por ordem do grande e saudoso Papa João Paulo II, recorda a doutrina eclesiológica tradicional do magistério eclesiástico, ao dizer que, por disposição de Deus, a salvação não se dá sem relação com a Igreja: “A Igreja é 'sacramento universal da salvação', porque, sempre unida de modo misterioso e subordinada a Jesus Cristo Salvador, sua Cabeça, tem no plano de Deus uma relação imprescindível com a salvação de cada homem” (n.20, o grifo é meu). Mesmo aqueles que se podem salvar fora dos quadros visíveis da Igreja em virtude de sua consciência cândida, podem-no por uma graça que mantém uma relação misteriosa com a Igreja, à qual Cristo Redentor uniu-se de modo irrevogável.



 
 
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