Liturgia Dominical
 
24º Domingo do Tempo Comum - B
Por: Padre Wagner Augusto Portugal
 
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"Ouvi, Senhor, as preces do vosso servo e do vosso povo eleito: daí a paz àquele que esperam em vós, para que os vossos profetas sejam verdadeiros". (cf. Eclo 36,18).

Meus irmãos,

O profeta Isaías(cf. Is 50,5-9a) nos apresenta Deus que nos oferece um “Servo” uma “língua de discípulo”(cf. Is 50, 4), um ouvido fiel: ele é o profeta, o autêntico porta-voz. Todo seu ser está a serviço da Palavra de Deus. Por isso o resultado não poderia ser outro: a perseguição. Entretanto, cônscio de sua união com Deus, nada teme, porque Deus está com ele. Esta profecia hoje pode e deve ser identificada com Deus e a sua palavra encontramo-la em Jesus Cristo, que dá a sua vida por fidelidade à sua mensagem e aos homens que a acolhem; porque ele é o “Servo de Deus” em plenitude.

Irmãos e Irmãs,

Simão Pedro, no Evangelho de hoje(cf. Mc 8,27-35), falando pelos Doze Discípulos, diz claramente: “Tu és o Messias”(cf. Mc 8, 29). Mas, imediatamente, Jesus faz os seus discípulos ver o que se deve entender por esse título. Pedro pensava provavelmente num “Filho de Davi”, num guerreiro, num herói nacional, libertador da opressão estrangeira, etc. Entretanto Jesus quer revelar um outro sentido do ser Messias. Proíbe seus Doze Apóstolos de falar aquilo que Pedro reconheceu, pois levaria a perigosos mal-entendidos, e ensina-lhes que o “Filho do Homem”- a figura que encarnava a intervenção escatológica de Deus(cf. Dn 7,13-14), devia sofria, morrer e ressuscitar, o que fez com que Pedro reagisse imediatamente. Daí Jesus replicou: “Vai para longe de mim, satanás! Tu não pensas como Deus, e sim como os homens”(cf. Mc 8,33). Jesus censura a pouca visão de Pedro que não entendia ainda que Jesus ressuscitaria, ele mesmo que poucos minutos antes liderara a proclamação na fé messiânica de Jesus.

Meus irmãos,

Quem é Jesus? A essa pergunta vem a resposta de Pedro: “Tu és o Cristo”(cf. Mc 8, 29). O Cristo, o Messias, o Esperado, o Enviado do Pai.

Ao sermos perguntados sobre quem é Jesus nós devemos também nos questionarmos sobre a que Jesus nos conduz. Jesus nos conduz ao mistério da Cruz. O mistério da Cruz de Cristo e o mistério da cruz de cada um que quer ser seu discípulo. Por isso devemos sempre lembrar do testemunho do Centurião Romano: “Verdadeiramente este era o Filho de Deus”(cf. Mc 15,39). Nessa confissão de que Jesus é o Cristo, o Senhor vem o compromisso de todos os Batizados: “Pregai o Evangelho a toda a criatura”(cf. Mc 16,15).
Assim, São Marcos aponta os horizontes e as qualidades do discípulo que quer morrer com Jesus e por Jesus. Por isso os Apóstolos terão muita dificuldade em compreender os ensinamentos de Jesus, mesmo depois da Ressurreição de Jesus.

Caros irmãos,

Pela cruz, à luz. Pela cruz à luz somos chamados a nos seduzirmos pela missão de anunciarmos o Cristo! Com São Bernardo que nos deixou esta frase memorial: “Pela Cruz, à luz!”, Jesus ensina que, para ganhar a vida, é preciso perdê-la; ensina que, para receber, é preciso renunciar. O Evangelho ressalta a oposição entre a sabedoria de Deus e a sabedoria do homem, a escala de valores segundo Deus e a escala de valores segundo nossos critérios humanos. As criaturas humanas vivem a vida toda em meio a contradições. E foi a essas criaturas que o Cristo veio trazer um destino divino. Compreender essas oposições, discerni-las e escolher o modo de pensar e agir de Deus e por ele pautar o comportamento chama-se CONVERSÃO.

Não se pode seguir Jesus, tendo como modelo de orientação cristã a sabedoria humana – que manda satisfazer os instintos, usar de tudo, armazenar, ambicionar, ser auto-suficiente, silenciar a oposição, eliminar os contrários, receber o máximo com o mínimo de esforço. Ao mesmo tempo em que Jesus inicia a viagem decisiva a Jerusalém, começa a apresentar aos seus Apóstolos as qualidades do verdadeiro discípulo, qualidades que são diferentes das que exigiam de seus seguidores os mestres da Lei e da espiritualidade judaica. Isso inclui que o discípulo deverá morrer com o Mestre. Pode não ser uma morte física, mas certamente será uma morte aos próprios interesses, em benefício aos interesses de Deus.

Quais foram às reações dos ouvintes aos ensinamentos de Jesus hoje? Uns se admiravam. Outros ficaram estupefatos. Outros maravilhados. Outros impressioram-se com extraordinária atitude. E você?

Meus irmãos,

Jesus é mais do que Elias e Moisés e Ele vai deixar isso muito claro para os seus discípulos no caminho da viagem para Jerusalém. Jesus hoje nos ensina que não adianta somente se impressionar com Ele e admirar os seus milagres. É preciso assumir sua maneira de pensar, de comportar-se, de fazer a vontade do Pai até à morte e morte de Cruz(cf. Fl 2,8).

Jesus hoje fala da sua morte como MISTÉRIO DE SALVAÇÃO. A MORTE DE JESUS É MISTÉRIO. MISTÉRIO DA CRUZ. MISTÉRIO DE NOSSA FÉ. Mistério da vitória de Jesus que venceu a morte pela sua ressurreição. Esse é o grande segredo messiânico. Os discípulos demoraram a entendem o mistério. Ademais, Judas traiu Jesus. Pedro negou-o. Os outros discípulos fugiram. São contraposições da história. São contraposições de nossa vida ainda hoje. Enquanto os discípulos fogem, Jesus retorna para congrega-los numa comunidade fraterna, onde a lealdade e o amor são os princípios básicos.

A Segunda Leitura(cf. Tg 2,14-18), por sua vez, nos ensina, exemplos do que é o caminho da cruz, da negação de si mesmo. Não é imediatamente um martírio público ou sei lá o quê. É a abnegação de si mesmo nas pequenas coisas práticas. Não apenas desejar bem-estar aos outros, mas repartir com eles do que é seu, tirar algo de si para ser realmente irmão e “próximo” do necessitado. Fé não é uma adesão meramente intelectual; é escolher o caminho da negação de si em prol do irmão. E isso, porque Cristo no-lo mostrou. Porque lhe damos crédito, na experiência única que ele teve de Deus e que ele quer repartir conosco.

A fé sem a caridade em atos não vale nada. A fé sem as obras é um cadáver. Não existe verdadeira fé sem autêntica caridade, não há ortodoxia sem ortopráxis.

Meus irmãos,

Deus, que sofre conosco num ato supremo de amor, ama o mundo! Não permite o mal tranquilamente, como que cruelmente! O mal não vem dele; ao contrário, ele o combate. Deus se apresenta a nós como salvador, numa das penas de morte mais cruéis que a humanidade conhece: uma estaca vertical, uma trave horizontal, e aí, suspenso, há um homem, que é Deus. Aquela cruz se prolonga em todas as direções como um homem de braços estendidos indica o insondável mistério de Deus, o centro do mistério. Na cruz Deus abriu o seu coração, revelou o seu mais profundo segredo: um Deus solidário com todos os homens.

O seguimento de Cristo é de adesão a Jesus e passa pela renúncia a tudo e a todos pelo Cristo. Assim é radical o fecho do Evangelho de hoje: “Se alguém me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga. Pois que quiser salvar a sua vida vai perde-la; mas quem perder a sua vida por causa de mim e do evangelho vai salva-la”. (cf. Mc 8,34-35). Não basta apenas o conhecimento de quem é Jesus. É preciso mais, um comprometimento radical com o Cristo. Devemos acreditar na totalidade do mistério do Cristo e do homem e agir de acordo. Fé e obras se completam. Ver e considerar sempre o divino e acolher igualmente o humano, tanto em Jesus Cristo como em nós e no próximo. Por este grandioso mistério demos graças a Deus!

 
 

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